segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Dengue - Uma Aventura

Era uma época conturbada. Estava em época de provas finais na faculdade, andava dormindo muito pouco, estudando demais, fazendo muitos trabalhos. Isso acontece todo período, mas é sempre muito estressante. No dia seis desse mês, uma sexta-feira, seria mais um dia agitado: eu tinha uma prova, uma apresentação de trabalho, e tinha que estudar para as provas da semana seguinte.
Mas acabou sendo um dia muito mais agitado do que eu tinha imaginado.
Era de madrugada e eu estava dormindo, até que acordei. Sentindo dor. Acordei por causa da dor e não consegui dormir de novo por causa dela. Não era uma dor em um lugar específico, nem era uma dor normal: era uma dor insuportável, no corpo todo. Também tremia de frio, e ao mesmo tempo suava muito. Minha cabeça doía como se um rolo compressor estivesse passando em cima dela. Eu mal conseguia me mexer, e cada movimento fazia tudo piorar. Parecia que eu estava morrendo. Parecia mesmo que eu estava morrendo.
Um pensamento me veio à cabeça. Eu quis negar. Disse a mim mesma que não era aquilo, que podia ser qualquer coisa. Mas a palavra voltou à minha cabeça. Eu sabia o que era. Sabia desde que abri os olhos e tive a sensação de que estava sendo pisada por um elefante.
Dengue.
Não deve ser, eu disse para mim mesma, diagnóstico de dengue não é uma coisa tão simples assim. Mas não se sente uma dor como aquela por causa de uma gripe. Aliás, não consigo pensar em nenhuma outra doença comum que faça alguém sentir tanta dor. Ok, disse para mim mesma, isso parece mesmo dengue.
E era.
Consegui me manter quieta até de manhã, quando minha irmã acordou. Pedi socorro a ela, e logo meus pais estavam no quarto me acudindo.
À base de remédios, consegui fazer a prova aquele dia (que por sorte foi em trio, caso contrário teria sido um desastre). Mas mandei a apresentação do trabalho pro espaço, e fui para casa, onde fiquei sofrendo o resto do dia.
Só de lembrar disso, sinto a cabeça doer. Quem só teve doenças mais simples e nunca teve dengue não é capaz de imaginar a dor.
O sábado foi ainda pior, e a madrugada de domingo bateu o recorde. Como tenho o estômago fraco, acabei passando mal pelo excesso de remédios (eu estava tomando oitocentos miligramas de paracetamol para a dor). A dor só piorava. Também tinha febre, e a febre não abaixava de jeito nenhum. Meus pais acabaram tomando uma decisão drástica: me levaram para o hospital.
Só que existe uma coisa muito peculiar no tratamento da dengue pelo sistema público: eles não atendem casos de dengue em hospitais. A informação que nos deram foi que, mesmo que você chegue lá literalmente morrendo, eles não te atenderão se for dengue. Por quê? Não sei. Não tenho a menor ideia.
O jeito foi ir para o UPA de Carapina.
Eu não sei se existem UPA's e PA's em outros lugares, então aqui vai uma breve explicação: UPA significa Unidade de Pronto Atendimento (PA é a mesma coisa, sem o "Unidade"), e é como um posto de saúde, mas para atendimentos emergenciais, inclusive fazendo internações em alguns casos. Também podem ser chamados carinhosamente de Portas para o Inferno, Casa dos Desesperados, etc. São um inferno. Ficam estrategicamente localizados nos piores lugares possíveis, têm um atendimento péssimo, vivem lotados, e a impressão que tenho é que os médicos que trabalham ali largaram a faculdade na metade do curso (ou sofrem de amnésia ao pisar ali dentro). E, fora os postos de saúde (que não abrem em fins de semana), são os UPA's que atendem casos de dengue.
Como era domingo de manhã, tive a incrível sorte do UPA de Carapina estar quase vazio. Fui atendida bem rápido, fiz um exame que indicou que eu devia estar mesmo com dengue, me colocaram no soro, me passaram milhares de remédios - inclusive um que eu não poderia de forma alguma tomar em caso de dengue - e me mandaram para casa, dopada.
No dia seguinte, fui ao posto de saúde do meu bairro - aliás, o posto do meu bairro é excelente, e o tratamento que tive lá foi muito bom. E então eu, que sou uma pessoa que nunca vai no médico, de repente me vi em uma peregrinação diária por consultórios. Nos vinte dias em que a dengue durou, eu fiz mais exames de sangue do que devo ter feito na minha vida inteira. Tudo para controlar o nível de plaquetas, que estava a cento e doze (o normal é quatrocentos e pouco).
Não existe um tratamento de verdade para a dengue, com remédios ou coisas do tipo. A única coisa que se pode fazer é beber o máximo de líquido que for possível, e um pouco mais. O médico me mandou beber cinco litros de água por dia, coisa que eu obviamente não consegui - e olha que normalmente eu bebo muita água. Minha irmã e meu pai também pegaram dengue, e como minha irmã não bebe água, ela conseguiu a proeza de ficar muito pior do que eu - as plaquetas foram para oitenta e pouco - e demorou bem mais para se recuperar. Eu, enquanto escrevo isso aqui, já estou melhor mas ainda não estou cem porcento.
O mais engraçado é que a gente descobriu que existem tratamentos alternativos que não são receitados nos postos de saúde, mas que funcionam e não são tão caros. Existe um remédio homeopático chamado Proden, que a minha irmã tomou, que funciona e é muito bom. Existem outros tratamentos à base de plantas que não são "mágica", realmente funcionam. E eles são proibidos de serem receitados em consultórios públicos.
Outra coisa muito legal que descobri é que o paracetamol, apesar de ser muito usado no combate à dor causada pela dengue, é prejudicial ao fígado e pode acelerar processos de dengue hemorrágica. Ou seja, se você estiver só com uma denguezinha (se suas plaquetas não caíram muito) não tem problema tomar, mas se for um caso mais grave e você tomar paracetamol, você pode morrer. Mas no posto eles não falam isso, só falam para evitar tomar em excesso e não explicam o porquê. Muito legal isso.
Além disso, muitos remédios que são contra-indicados em caso de suspeita de dengue não deveriam ser. Você só não pode tomar remédios que causem hemorragia ou que tenham AAS. O Benegripe não tem AAS, ou pelo menos não consta na fórmula, mas ele está nas listas de remédios que não pode tomar. Por quê? Não sei.
Mais uma: enquanto você está com dengue, você não vai saber se você está com dengue. O exame para confirmar só pode ser feito depois de oito dias, e o resultado só fica pronto uns dez dias depois. Ou seja, enquanto você está com os sintomas, eles vão te tratar pressupondo que você está com dengue, e e você só vai saber se teve mesmo dengue quando já estiver curado.
Resumindo tudo: se você estiver com dengue, beba o máximo de líquido que conseguir e um pouco mais. Não tome paracetamol. Vá atrás de tratamentos alternativos. E (e isso serve para qualquer doença) não confie cem porcento nos médicos. Nunca.

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