quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Uma Volta para Casa

Há um furo no cabo do meu guarda-chuva.
É assim que começa essa crônica. Estou em um ônibus olhando para algum ponto distante, e de repente percebo que há um furo no tecido que cobre o cabo do meu guarda-chuva. E é um tecido tão bonito.
À minha frente, há uma garota e um homem mais velho. A garota carrega uma sacola com um grande "&" estampado. O homem usa um ridículo boné xadrez. Odeio bonés, odeia estampa xadrez. Podem ser pai e filha. Parecem-se um pouco.
Uma mulher segura no encosto do banco à minha frente. Não a olho, mas sei que é mulher só pela mão. As unhas têm restos de esmalte vermelho, o que dá um aspecto ruim, de alguém cansada de tudo. Olho disfarçadamente para ela: é uma garota, pode ser mais nova do que eu. Começo a construir na minha cabeça possíveis histórias para ela. Quando ela tinha oito anos, foi espancada pelo padastro e um juíz a mandou ir viver com os tios. Os tios a criaram mas nunca se importaram com ela. Tem um namorado que não ama e vai...
Na rua, passa uma mulher sozinha. Sozinha és, criança, sozinhos somos nós. Esse é um daqueles dias que começam mal e terminam pior.
Eu sempre pego esse ônibus e sempre passo por esse caminho, mas é a primeira vez que reparo naquela casa. Seria uma casa normal de dois andares, semi-terminada, se não fosse por um detalhe: há uma porta que se abre para o nada. Uma porta na parede do segundo andar, dando para a rua. Isso me faz lembrar certas construções na UFES. Aliás, aquela perto do CT-IX já foi transformada em uma saída de emergência ou algo parecido. Enfim. Fico tentando adivinhar para o que aquela porta foi projetada. Talvez para se livrar de visitas indesejadas. Claro que a hipótese mais provável é que vá ter uma varanda ou qualquer coisa parecida ali em cima, e eles ainda estão construindo. Mas o engraçado é que a porta é tão bonita. E dá para o nada. Absurdo.
O ônibus dá uma freada brusca e levo um susto. Perco completamente o raciocínio, o que acontece com uma facilidade maior do que eu gostaria. Suspiro, encosto a cabeça na janela. Penso nele. Ultimamente, a coisa que mais faço é pensar nele. Não que ele também pense em mim. Não que isso vá realmente fazer alguma diferença.
Esse é um daqueles dias que começam mal e terminam pior.

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