sexta-feira, 19 de junho de 2009

Bicicleta

Quando eu tinha uns quatro anos ganhei minha primeira bicicleta. Não lembro qual era a cor nem nada a respeito dela, mas lembro da sensação que tive quando cheguei na sala e a vi ali, esperando por mim. Era presente de alguma coisa, aniversário ou natal, e eu provavelmente não estava esperando ganhar algo nem parecido.
Na mesma hora fui tratar de “andar” com ela. Não tinha rodinhas, e meu pai foi me ensinar – ou tentar me ensinar, pelo menos. Disso eu lembro muito bem: ele me segurava, eu ia andando – olhando para baixo, para a roda, ao invés de olhar para aonde eu estava indo – e, assim que ele me soltava, eu caía no chão. Tinha certeza absoluta de que a qualquer momento ia quebrar o pescoço ou cair de cara na rua, com a bicicleta em cima de mim. Lembro que tinha muito medo – sempre tive medo quando meus pais estavam por perto. Provavelmente porque sabia que se chorasse eles íam me salvar, então tinha que chorar muito, e bem alto.
Pois bem. A primeira manhã de ensaios foi um fracasso. Depois meu pai foi trabalhar, e eu tive que deixar minha bicicleta paradinha na varanda. Tratava ela com muito carinho. Como se fosse meu bichinho de estimação. Embora fosse incapaz de andar nela e tivesse certeza de que ela desejava me matar.
À tarde, fui brincar na rua. Naquela época as crianças brincavam na rua. E estavam todos lá, meus amigos e inimigos, brincando juntos, como sempre. Como muitos eram bem mais velhos do que eu (inclusive meu primo lindo, que já era praticamente adulto, tinha nove anos) eles sabiam andar de bicicleta. Então, levei minha bicicletinha, só para mostrar. Ainda lembro de mamãe dizendo “pra que você vai levar isso se você não sabe andar?”. Mas eu levei mesmo assim.
Não tenho muita certeza do que aconteceu depois. Meu cerébro não é um gravador. Me lembro vagamente de uma discussão sobre bicicletas e de alguém zombar de mim por não saber andar. E ainda queriam usar minha bicicleta. Eu não deixei, é claro. Minha irmã ainda não era nascida e eu era egoísta ao extremo – não que hoje seja muito diferente, e não que me orgulhe disso. Sei que, no meio disso tudo, houve uma corrida de bicicletas. Tinha uma descida no fim da rua; os competidores deveriam ir até o final e subir de novo. Eu não sabia andar mas inventei de participar.
Disso eu me lembro. Alguém – provavelmente meu primo – se opôs à idéia de eu participar, porque era muito pequena e não sabia andar de bicicleta. Eu – teimosa – disse que ia participar e que sabia andar, sim. Então, pra provar, subi na bicicleta e saí andando. Simples assim.
Não me perguntem como fiz isso, eu não sei. Tenho a impressão de que recebi algumas instruções do pessoal na rua, e as primeiras pedaladas não devem ter sido muito firmes; mas o fato é que subi e saí andando, e em dois minutos parecia que tinha nascido andando de bicicleta (isso seria interessante). Depois houve algum lapso de tempo, porque minha próxima lembrança é de algumas horas pra frente, eu ainda andando de bicicleta, e meus pais aparecendo na rua prontos pra me chamar a atenção. Mas ao ver a filhinha querida deles andando de bicicleta, eles não tiveram coragem, é claro. Por isso que eu sou assim, hoje. Culpa deles.
Quando, séculos depois, minha irmã ganhou uma bicicleta (e aí eu já andava na bicicleta da minha mãe), as coisas demoraram mais. Culpa das malditas rodinhas, que nunca precisei usar mas que vieram de brinde na bicicleta dela. Acostumam a criança a andar com aquele troço, então ela pensa, "se a minha bicicleta tem isso é porque é perigoso andar sem", e nunca aprende a andar sem aquilo. Ela ficou muito tempo andando com rodinhas, e quando tentou tirar, demorou mais de uma semana pra conseguir andar direito.
Hoje, ela anda bem, é claro. Isso foi há muito tempo. Estou querendo ensinar meu sobrinho (não é sobrinho de verdade, mas é filho da minha amiga/irmã) a andar de bicicleta. O menino tem três anos, mas parece que tem seis. Ele tem potencial. Sei que vai se sair bem. E sem as rodinhas.

Um comentário:

Viola disse...

hehehehhae
me identifiquei com a história, pois também aprendi a andar de bike na marra. mas demorei um tanto e uns tombos a mais que você.

;)