quinta-feira, 28 de maio de 2009
Cristo e a música dos Beatles
Na época, eu até gostava das musiquinhas. Eu tinha doze anos e gostava de qualquer coisa muito fácil. Tinha uma música que dizia que a paz que Cristo nos dá era melhor do que a música dos Beatles (!). Eu não conhecia as músicas dos Beatles. Também não conhecia a tal paz de Cristo. Muito menos Cristo. Mas se a professora falou, então devia ser verdade.
Tinha outra (ou era a mesma?) que dizia "não atirei o pau no gato mas atirei minha vida nas mãos do Senhor". Cara, que letra. Fantástico. As crianças devem ter tido uma epifania ouvindo isso. Eu lembro de, na primeira vez que ouvi, ter tido uma crise de riso.
Outra: uma tal "leão de Judá". Pus Judá em letra maiúscula porque imagino que seja um lugar, mas realmente não faço idéia, e naquela época fazia menos ainda. Só lembro que a música ficava repetindo "leão de Judá", "aleluia" e "oh glória em Deus". As crianças evangélicas da minha sala entravam em êxtase cantando isso, mas eu odiava. Quem era esse leão? Não gostava de leões. Não queria ficar cantando "aleluia" para um leão. E o que, afinal, queria dizer "aleluia"?
Acabei de me lembrar que, naquela música que fala dos Beatles, tinha uma parte (não sei se era o refrão) que dizia "Jesus Cristo apareceu e me iluminou, me deu vida". Mais uma coisa que eu não entendia. Como assim, "me deu vida"? A pessoa não estava viva antes? Eu pensava que, ou tinha algo a ver com ressuscitar os mortos, ou então Jesus era o médico que tinha feito o parto do indivíduo. Nunca entendia nada dessas músicas.
Mas era divertido. A gente perdia quinze minutos da aula (as aulas naquela época duravam cinquenta minutos) nessas cantorias. Eu adorava.
terça-feira, 26 de maio de 2009
Meu filho será rockeiro
Participo de uma comunidade no Orkut chamada “Meu Filho Será Rockeiro”. Uma brincadeira, claro. Primeiro porque não tenho nem pretendo ter filhos, e segundo porque, mesmo se cometesse essa loucura, nada me garante que ele vá ser parecido comigo ou com o que eu gostaria que ele fosse. Seria mais certo se a tal comunidade se chamasse “Gostaria que Meu Filho Fosse Rockeiro”, mas aí não teria graça.
É engraçado isso. Na maioria das vezes, os filhos gostam de coisas que não têm nada a ver com o gosto dos pais. Aliás, é muito maior a chance de que eles gostem do oposto do que os pais gostam. Meus pais gostam de música sertaneja e adorariam que eu e minha irmã gostassemos também. Por algum motivo oculto, nós duas gostamos de rock.
Claro, sempre tem alguma coisa dos pais em nós. Gosto de música clássica, como os meus. Gosto de matemática e de ler, como meu pai. Gosto de sair à noite e de dançar, como minha mãe – embora ela nunca saia nem dance. Minha irmã gosta de desenhar, igual ao meu pai – embora o faça muito melhor – e de deixar tudo arrumado, como minha mãe. Mas, nos gostos mais aparentes, somos drasticamente diferentes.
Por quê? Fico pensando nisso e não chego à nenhuma conclusão. Não é por revolta nem essas idiotices adolescentes, porque não sou adolescente e sempre me dei muito bem com meus pais. Não é por modinha nem influência de amigos, até porque meu gosto também é diferente do da maioria dos meus amigos. Pelo que, então? Tem que haver uma explicação lógica. Somos criados por aquelas pessoas, elas nos programaram desde que nascemos. Podiamos não ser uma cópia perfeita do que elas imaginaram para nós, mas deveriamos ser muito parecidos.
Talvez – estou tendo essa idéia agora então não sei se faz muito sentido – os pais na verdade querem que sejamos o oposto daquilo que dizem querer que a gente seja. Meu Deus, que coisa confusa. Mas faz sentido. Eles dizem “quero que meu filho seja igual a mim, que goste de música sertaneja como eu”, mas no fundo eles pensam “eu gosto de música sertaneja e aqui estou, espero que ele goste de rock e que chegue muito mais longe do que eu”. Pode ser.
Não. Não faz nenhum sentido.
Tive outra idéia. Estou cheia de idéias hoje. Os pais realmente querem que sejamos iguais a eles – é o motivo de termos filhos, queremos mini-clones nossos – e nos bombardeiam desde pequenos com os gostos deles. Crescemos ouvindo a música que eles gostam, comendo a comida preferida deles, vendo os filmes que eles adoram. Com o tempo, vamos enjoando disso, até o ponto em que tudo o que eles amam se torna insuportável para nós. E vamos procurar gostar de coisas que sejam o mais distante possível daquilo que eles gostam. Isso faz mais sentido.
Um exemplo prático. Meus pais gostam de música popular, música sertaneja e algumas românticas. Existem uma ou outra desses estilos que eu gosto, geralmente por me trazerem lembranças da infância. Mas eu gosto de rock. E, como é de conhecimento geral (se você não sabia, fique sabendo agora) eu amo U2. Amo é pouco. Eu sou louca pela banda U2. Se um dia tivesse filhos, eles iam crescer ouvindo U2.
Conheço uma menina (não tão menina) que também é louca por U2 e tem dois filhos, um de treze e outro de onze anos, se não me engano. Os filhos dela odeiam U2 e gostam de axé. Sem brincadeira. Eles não suportam U2. E não posso culpá-los. Nem poderia culpar meu filho se ele odiasse U2 (mas o mataria se gostasse de axé). A pobre criança cresceu ouvindo a mesma banda em quase todos os momentos da vida dela, vendo a mãe se descabelar por causa do Bono, sendo obrigada a ficar acordada até tarde pra ver um especial do U2 que ele não queria ver. É claro que vai se encher e não vai querer ver U2 nunca mais na sua frente.
Claro, às vezes os filhos são quase uma cópia dos pais. Mas geralmente são pessoas que, naquele assunto específico, não têm uma personalidade. É aquele tipo de pessoa que, se ler no jornal “Prefeito é Ladrão”, vai falar “é verdade!”, e se no dia seguinte estiver no mesmo jornal “Viva o Prefeito”, vai gritar “viva!”. São pessoas que absorvem opiniões alheias – às vezes sem perceber – e acreditam que aquelas são suas opiniões também. Vejo esse tipo de gente aos montes por aí.